Comunidades e diversidade

Sheila Gomes
Comunicaminhos
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4 min readJan 4, 2019

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O que as comunidades ganham com a diversidade

Foto de Brittani Burns no Unsplash. Tradução livre logo abaixo.

Damos as boas-vindas a pessoas de todas as raças e etnias, todas as religiões, todos os países de origem, todas as identidades de gênero, todas as orientações sexuais, todas as habilidades e deficiências, todos os idiomas, todas as idades. Todos. Conte conosco. Você está seguro(a) aqui.

Para mim, comunidades sempre foram a resposta para tudo. O potencial do grupo é sempre maior do que apenas a soma dos indivíduos. E apesar de nem sempre ser fácil viver em comunidade, é justamente a energia e a disposição exigidas para que ela exista e se mantenha que acaba gerando algo maior e mais forte.

Com isso quero dizer que comunidade não é apenas um bando de gente junta em torno de pontos ou objetivos comuns. Para mim, não existe comunidade sem senso de pertencimento, espaço para aprendizado e oferta de apoio. É um lugar de gente como a gente, que defendemos e apoiamos e onde nos sentimos defendidas e apoiadas. Ao menos foi assim que me senti nos grupos de que fiz parte até hoje que chamo de comunidades. Porque também estive em grupos que se chamavam assim, mas que não praticavam essas ideias. E foi assim que entendi que só chamar de comunidade não basta. Tem que ter trabalho, engajamento e muito diálogo. Mas então onde fica a diversidade nessa história?

Vou contar duas coisas que aprendi na escola (de todos os lugares, pois é) que baseiam minha noção de diversidade. Ainda no ensino fundamental aprendi que a miscigenação deixou a humanidade mais forte, pois a biologia seleciona os mais resistentes para formar seres mais aptos a sobreviver, então quanto maior a amostra, maior a chance de se ter uma seleção melhor. Já o cruzamento de iguais pode trazer problemas (pessoas da biologia, por favor, me corrijam se a minha lembrança for incompleta ou incorreta). Ou seja, muito cedo na minha vida entrou o conceito de que o diferente nos reforça. Pode até ser que esse conceito da biologia tenha mudado ou seja abordado de outra forma hoje, mas a ideia aqui é mostrar o contraponto que essa visão do diferente foi na minha vida, pois até então eu só via iguais ao meu redor (já que nasci e vivi até os 40 anos em Santa Catarina, um estado que considero bastante intolerante à diferença).

Outro aprendizado importante foi já na faculdade, numa aula de sociologia, em que descobri o que é o etnocentrismo: a ideia de tomar a cultura do outro (alheia ao observador) como algo menor, sem valor, errado, primitivo. Assim nascem e são reforçados os preconceitos e a segregação, e se alimenta a tendência de classificar outros grupos a partir da noção de que o nosso grupo é mais importante, o “certo”, o “normal”.

Essas e outras experiências foram arredondando a noção de como é importante abraçar a diversidade e se aproximar das pessoas diferentes de mim, para podermos todos evoluir, valorizando a própria humanidade espelhada no outro. Nossas necessidades básicas são iguais, mesmo quando as identidades e as formas em que cada um se expressa e vive no mundo são diferentes, uma ideia que reaprendi na comunicação não-violenta.

Por mais que muita gente fale sobre diversidade, nas comunidades de que faço parte (tradução e tecnologia), ele ainda é um tema que pouca gente defende ou sente que tem propriedade para falar a respeito. Principalmente de como a diversidade colabora para as comunidades crescerem e se expandirem de modo sustentável.

(…) estarmos abertos a aprender é o que vai tornar a comunidade um espaço de evolução e não de reprodução de apenas uma parcela do (re)conhecimento existente.

Considerando a importância do tema, como promover a diversidade então? Se dispondo a ouvir, ler, refletir, e quiçá, discutir a respeito de: MST, os porquês de a branquitude ser tomada como norma, o feminicídio que é um produto da cultura do estupro, identidade de gênero, feminismo (que se não existisse, eu, mulher, não estaria aqui hoje escrevendo isso sem (muito) medo), privilégios, acessibilidade. Enfim, é reconhecer a existência e respeitar o diferente como pessoa, com os mesmos direitos que você. E precisa saber tudo isso pra fazer parte ou criar uma comunidade? Não, mas estarmos abertos a aprender é o que vai tornar a comunidade um espaço de evolução e não de reprodução de apenas uma parcela do (re)conhecimento existente. E divulgar esse aprendizado sobre diversidade, me parece mais importante do que nunca, já que até o termo está em sério risco de ser apagado aos poucos das discussões.

Um bônus da inspiradora banda paranaense Tuyo (Tu e Yo, você e eu) e sua música para refletir… e curar.

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Sheila Gomes
Comunicaminhos

Tradutora que constrói as pontes possíveis entre comunidades. Também localiza sites, software e jogos.